Sobre Quando Nietzsche chorou, de Irvin D. Yalom, pela Ediouro, Rio de Janeiro, 26a. edição, 2005, 407 páginas. Tradução de Ivo Korytowski. ISBN 85-00-00795-8
Quando Nietzsche chorou é o que Milan Kundera chamaria de um “romance que pensa”: com a qualidade necessária para não perder seu caráter literário, coloca em pauta um debate filosófico de grande importância – o que se trava entre a filosofia nietzschiana e a psicanálise freudiana.
A partir de uma hipotética situação em que uma linda mulher russa – Lou Salomé, com apenas 21 anos – convence um renomado médico vienense do final do século XIX, amigo de Freud (Dr. Breuer) a ajudar Nietzsche (pós Humano, demasiado humano e A gaia ciência) a livrar-se de uma aventada propensão ao sucicídio, desenrolam-se acontecimentos que colocam frente a frente duas linhas de pensamento aparentemente irreconciliáveis. De um lado a idéia de que o desconforto e todos os problemas decorrentes de inadequações à vida social, familiar ou a dois podem e devem ser superadas ou amenizadas por ajustes proporcionados pela psicoterapia; de outro, a tese de que o sofrimento é a condição para o crescimento e o fortalecimento do indivíduo, que deve abrir mão de lenitivos morais e religiosos para suportar a vida.
A relação amorosa, o casamento (como uma de suas formas), o apreço à liberade (inclusive sexual), o apego a valores (morais, religiosos, profissionais etc.) ou sua negação – temas absolutamente candentes desde sempre, são discutidos com a desenvoltura de um profissional e acadêmico da psicanálise, afortunadamente dotado de grande sensibilidade e habilidade literária.
Lido levianamente, este livro pode se encaixar com relativa facilidade entre os compêndios de auto-ajuda (mas somente por aqueles que não precisam de auto-ajuda para apreciar a leitura). Lido mais atentamente, deixa a desejar, obviamente, para uma abordagem direta das obras representativas do pensamento dos autores por trás da cortina (Freud e Nietzsche), mas oferece um aperitivo que capta muito de suas contribuições. Com margem a discordâncias e polêmicas, evidentemente.
É uma tentação imaginar como as pessoas do gênero de Anna O. (jovem paciente pela qual o Dr. Breuer quarentão se apaixonou), Mathilde e Eva (esposa e secretária do próprio, respectivamente) e Lou (o pivô da história) – mulheres...essas mulheres! – interpretariam este livro, fundado numa leitura estritamente masculina das intrincadas e às vezes devastadoras relações entre homens e mulheres.
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