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  • Foto do escritorValdemir Pires

Filosofia e Ciência do tempo



Sobre Filosofia e Ciência do tempo, de Bernard PIETTRE, trad. de Maria Antonia Pires de C. Figueiredo (Bauru: EDUSC, 1997, 223 p.)

 

            O autor deste livro em formato de bolso considera que o recuo da filosofia na abordagem da questão do tempo (tão sua na antiguidade e na Idade Média), desde o advento da Ciência moderna (com suas tecnicalidades e matematização) consiste num prejuízo à compreensão deste tema, até hoje objeto de controvérsias. Ao defender que tanto a Ciência como a Filosofia persistam, dialogantes, no esforço de elucidação da natureza e dos significados do tempo para o ser e para o mundo/universo, Bernard Piettre oferece a sua contribuição: este livro de divulgação científica/filosófica muito esclarecedor.

            No capítulo 1 são discutidas as visões filosóficas que consideram o tempo como algo que existe enquanto criação da mente humana, desde Aristóteles (tempo como número do movimento) e Platão (tempo como imagem móvel da eternidade) e Plotino até Bergson (tempo como duração, subjetivamente sentida), com especial atenção para a propositura famosa de Santo Agostinho (o tempo existe como presente do passado – memória, presente do futuro – expectativa, presente do presente – atenção).

            No capítulo 2 o assunto é a atitude científica moderna de desvalorizar o tempo como variável definidora da realidade. Fica claro que de Newton (Ciência) a Kant (Filosofia), o tempo migrou para uma condição metafísica, com pouco a ver com a realidade material: um absoluto universal na Física newtoniana e um juízo a priori no idealismo kantiano. Enquanto “A ciência moderana aboliu o tempo” (p.83), os filósofos o deixaram a cargo de seus “epistemologistas” (p. 7), até a eclosão da fenomenologia, Heidegger o seu ponto de chegada.

            O capítulo 3 atualiza o debate até as revoluções da Física no século XX. Trata da física einsteiniana, relativística, em que o tempo adquire uma materialidade, porém uma materialidade estranha ao senso comum: ele se torna a quarta dimensão presente no “tecido” espaço-tempo que constitui o universo, tecido este curvado pelas massas, dando origem ao campo gravitacional. A esta altura a Ciência assume o acelerador das formulações, a Filosofia mergulhando em perplexidades novas, amplificadas com o posterior surgimento da Física quântica (em que o tempo, assim como o espaço, se “esfarela”). O tempo relativo (nunca o mesmo em nenhum lugar, em termos extremos), o possível (e inimaginável) início do espaço e do tempo (do universo – Big Bang) e seu concebível (e controverso) fim (Big Crunc), as incertezas e imprevisibilidades quânticas, tudo isso é passado em revista neste capítulo, tendo por pano de fundo o questionamento acerca da existência de uma “flecha do tempo” (orientação que vai do passado para o futuro, passando pelo presente). É problematizada a negação de Einstein a respeito da veracidade desta orientação cronológica, no contraponto com as tese da entropia (segunda lei da termodinâmica) e das estruturas dissipativas de Prigogine. A conclusão chega a ser poética: “Onde existe tempo existe jogo (...) Sim, Deus joga dados... [ao contrário do que dizia Einstein] mas seguindo as regras do jogo que ele mesmo teria criado.” (p. 160)

            O capítulo 4 é dedicado à busca de resposta à pergunta “O mundo teria tido um começo?”, discutindo as antinomias kantianas a respeito, em diálogo com as teses da física quântica e da fenomenologia heideggeriana. O nó da questão é saber se tudo (o universo) poderia ter surgido do nada, contrariando Parmênides. O esforço vai na direção de redefinir o nada e a noção de começo (pode existir uma que abandone a fundamentação cronológica do senso comum?).

            Da conclusão, que retoma o conjunto das discussões precedentes num esforço conclusivo, vale destacar a seguinte afirmativa que paga tributo à fenomenologia em seus últimos desdobramentos: “O tempo é portanto inseparável do real sem ser um ente real. (...) O tempo não é nenhum ente, donde a profunda identidade entre o tempo e o Ser, que Heidegger tentou estruturar.” (p. 218)

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