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Cidades visíveis - Hong Kong e Macau

  • Foto do escritor: Valdemir Pires
    Valdemir Pires
  • 3 de jun.
  • 5 min de leitura

Atualizado: 4 de jun.


Com destino a Zhuhai, vindo de Riad, passei rapidamente por Hong Kong, utilizando seu aeroporto internacional e a ponte marítima Hong Kong-Zhuhai-Macau. Após conhecer Zhuhai, retornei, dois dias depois, a Hong Kong e a Macau, permanecendo um dia em cada uma, com o objetivo de perceber e sentir as mudanças ali ocorridas desde minha última visita, em 1999.


 

Enquanto Zhuhai é uma completa novidade, em comparação com o que era em 1999, Hong Kong e Macau apenas consolidaram o que já eram no final do século XX. Hong Kong, um centro global de negócios; Macau, um local turístico centrado nos seus imensos cassinos. Ambas devolvidas à China no final dos anos 1990, pelo Reino Unido e por Portugal, respectivamente, mantendo-se com relativa autonomia política, que terminará por completo no final da década de 2040; Hong Kong com mais problemas, quanto a isso, do que Macau.

 


Nota-se facilmente que as três áreas (Zhuhai, Hong Kong e Macau – Z-HK-M) constituem um todo bem definido e integrado geograficamente, Zhuhai (ainda titubeante) parecendo uma iniciativa da China comunista-de-mercado para se afirmar diante das dúvidas que pairam sobre a efetiva integração de Hong Kong à sua política, embora Shenzen já seja uma afirmação forte neste sentido, como polo econômico incontestável.

 


Hong Kong continua sendo uma cidade visível, fervilhante e vibrante, mas o charme urbanístico (arranha-céus envidraçados desenhando um skyline notável) que a distinguia até o começo do século XXI é hoje suplantado por várias outras cidades chinesas edificadas do dia para a noite utilizando-se novas técnicas de engenharia e arquitetura.

 


A concentração populacional é um dado de realidade com que Hong Kong lida de modo exemplar. A começar pela questão da mobilidade urbana. O transporte ferroviário conta com um metrô moderno de alta qualidade (integrado ao aeroporto internacional), combinado com bondes elétricos à antiga, que além de contribuir para a mobilidade, embelezam as vias. O transporte rodoviário beneficia-se de ônibus de dois andares, à inglesa, e de uma vasta frota de táxis vermelhos e brancos, circulando juntamente com uma admirável quantidade de carros de luxo. Os veículos do transporte coletivo são utilizados para propaganda, contrastando a mobilidade urbana popular com marcas de grife internacional. Ao transporte por terra acrescenta-se o realizado por água, em modernas embarcações rápidas e suficientemente confortáveis.

 



Hong Kong é uma cidade-espetáculo. Embora não consiga esconder a extrema desigualdade que a marca, muito profundamente (hotéis de alto luxo, de um lado, e moradias-gaiola, de outro), passa a sensação de experiência desejável para aqueles que buscam imersão num futuro de possibilidades. Transnacional, multicultural, rebelde e irreverente, parece se movimentar sem descanso na ânsia de viver ou, mais, vivenciar a existência. Um hábito popular, que não deve existir em outro lugar, é o de ir às ruas, avenidas e praças, nos dias de folga, para, em pequenos grupos, passar manhã e tarde em atividades de lazer e cultura. O que produz o contraditório acontecimento de, defronte a uma loja da Rolex ou da Chanel, meia dúzia de jovens dançarem ao lado de uma barraca de acampamento e de uma pequena mesa armada para uma espécie de piquenique.

 


Nas ruas, com suas incontáveis ladeiras e escadas, inclusive rolantes, um formigueiro humano se desloca para lá e para cá, muitos jovens, num misto altos negócios, pequenos serviços, estudos, durante o dia e, à noite, badalação, tanto sofisticada quanto popular.

 


Hong Kong vive intensamente o presente, entre Ocidente e Oriente, desejando aquele e lidando espertamente com este; deixa o futuro (2049) ao futuro, quando entre capitalismo ocidental e socialismo-de-mercado chinês uma decisão menos ambígua que a atualmente em curso terá que ser tomada. A seu favor, o fato de que a China continental está gostando do que o mercado (tanto local como global) está lhe proporcionando, ainda que não aprecie as liberdades ao nível em que Hong Kong almeja mantê-las.

 

 


Apesar da pouca distância entre Hong Kong e Macau, elas nunca se assemelharam, não apenas pelo fato de uma ter sido colônia inglesa e outra, portuguesa, embora este fato tenha pesado sempre. No último quarto de século, após a devolução de ambas à China, as diferenças se aprofundaram. Enquanto Hong Kong se consolidou como centro de negócios e área marítima estratégica do comércio global, sem perder um certo apelo ao turismo, Macau concentrou-se na indústria dos jogos de azar e no turismo.


 

Na China continental e também nos países vizinhos, os jogos de azar são proibidos, o que transforma Macau num polo de atração dos apreciadores de cassinos, que nunca são poucos, ricos ou pobres. Da condição de Las Vegas do Oriente, aproveitou-se Macau para se tornar uma economia pujante, adicionalmente fortalecida por um tipo específico de turismo: o da imersão em experiências que emulam o ocidente.

 


A silhueta do cassino Grand Lisboa domina a vista na cidade, rivalizando com a icônica Torre de Macau. É possível observar, este prédio luxuoso face a face com a fachada da Igreja de São Paulo, desde o Morro do Forte, como se fé em Deus e esperança na Sorte ali estivessem trocando olhares de desafio.

 


Hoje a antiga colônia portuguesa conta com mais de três dezenas de casas de jogos, onde vão se divertir os ricos turistas que se hospedam nos numerosos hotéis de luxo.

 


A arquitetura local mistura antigas edificações tipicamente chinesas e portuguesas (incluindo calçadas em pequenas pedras e adornos em azulejos)  com modernos edifícios extravagantes ou tendentes à extravagância, com o objetivo de chamar a atenção do turista. Dentre eles, os que copiam atrações turísticas europeias, como, por exemplo, a Torre Eiffel e seus arredores em Paris, o Big Ben e suas proximidades em Londres, Veneza (Palácio Ducal, canais etc.); há até mesmo uma área com imitações recentes de prédios tipicamente portugueses, não obstante ali existam vários originais de valor histórico.


 


A imitação cara e tosca de ícones turísticos europeus como elemento de atração para o turismo local (que parece funcionar bem), faz suspeitar que: um, a fama chinesa de copiar não encontra limites; dois, o desejo oriental de emular a vida ocidental é um ponto fraco da cultura chinesa, mesmo atualmente, quando o desejo ocidental vai se tornando copiar a performance da China no que diz respeito ao crescimento econômico.

 


Nas ruas de Macau são incontáveis as motocicletas e motonetas, circulando ou estacionadas umas ao lado das outras, em fileiras enormes que truncam o trânsito de pedestres, mal aquinhoados por calçadas estreitas defronte às portas e portinholas comerciais. E numerosas são as pessoas idosas caminhando ou sentadas em bancos de praças e jardins, quando não estão praticando, em grupos mistos, danças ou algum tipo de exercício físico.

 


Macau, no tocante ao futuro, fez sua aposta: comprou tantas ou mais fichas que Las Vegas para aventurar-se na roleta da expectativa humana de ganho fácil com auxílio da sorte, crendo que a proibição de lançar-se a esta ilusão continuará sendo genérica, relaxada em poucos lugares. Adicionalmente, investiu na atração de endinheirados (principalmente novos ricos) pela extravagância e pelo bom gosto duvidoso (mercado em forte e rápida ascensão pelo mundo afora).



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