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  • Foto do escritorValdemir Pires

A ordem do tempo



Sobre A ordem do tempo, de Carlo ROVELLI, trad. de Silvana Cobucci, 1ª. reimpressão (Rio de Janeiro: Objetiva, 2018, 188 p.)

 

            Carlo Rovelli é um físico italiano que tem se dedicado ao estudo da gravidade quântica em loop, em cujas equações não existe nem é necessário aparecer o tempo. Trata-se de uma abordagem concorrente com a teoria das cordas, ambas ainda carentes de comprovação empírica na busca de ir além da teoria da relatividade como explicação do mundo físico.

            Seu A ordem do tempo é uma obra de divulgação científica de alta qualidade. Prima pelo respeito o que existe de conhecimento acumulado (distinguindo o que ainda é especulação teórica do que está experimentalmente comprovado), faz uso de uma linguagem clara e didática (sem a qual não haveria divulgação) e tem a sensibilidade e a responsabilidade de colocar o conhecimento científico no seu lugar (o da razão) e em contato com o lugar que na vida humana têm os sentimentos, as sensações, as ilusões, as paixões.

            A ordem do tempo desenvolve-se com base numa estrutura lógica muito consistente. Na primeira parte, com cinco capítulos, o tempo é “destruído” com argumentos muito bem apresentados da física relativística de Einstein e da física quântica, perdendo suas principais caraterísticas percebidas pelo senso comum: a unicidade (não é o mesmo em todo lugar, variando conforme a proximidade das massas e a velocidade), a unidirecionalidade (não existe uma flecha do tempo, ele não “passa” indo do passado para o futuro), a “agoralidade” (o agora daqui não é o agora em outra galáxia), a independência (não há tempo separado de espaço – só existe espaço-tempo), o “tecido” espaço tempo não é contínuo (esfarelado que é pelas novidades trazidas pela física quântica).

            Na segunda parte (três capítulos), Rovelli discute como é (ou seria?) o mundo sem tempo. A grande conclusão é que “nada é”, tudo apenas acontece. Não existem coisas, mas eventos. E uma das dificuldades para entender e explicar isso passa, também, pela gramática, na qual há sujeitos e objetos (seres e coisas) que, ao terem permanência, não podem ser abordados pela linguagem como o que de fato são – eventos.

            Na terceira parte (cinco capítulos e uma conclusão poética), a questão que se coloca é: Uma vez a razão tendo esclarecido que o mundo é sem tempo, como se explica que nós tenhamos dificuldade intransponível para ser, agir e interagir sem o tempo, sem isso que na realidade física stricto sensu não existe? O que acontece nesta parte é uma verdadeira viagem de volta: saiu-se de um mundo em que o tempo existia, chegou-se a outro em que ele desaparece e regressa-se ao mundo anterior, em que o tempo não existe aos olhos da razão, mas permanece na mente dos seres (nós, humanos) mergulhados em um mistério que a razão ainda não foi capaz de desvendar. “Este viver entre eventos passados e eventos futuros é central na nossa estrutura mental. Este é para nós o ´fluir´do tempo.” (p. 139).

            Ao contrário do que faz Stephen Hawking, em Uma breve história do tempo, afirmando que a Física substitui com mais realismo a Filosofia na explicação do universo (e, portanto, do tempo), Rovelli, depois de apresentar os avanços da Física na explicação do tempo, retorna aos filósofos para tratar daquele tempo que resta uma vez destruído o “inventado” pela Física Clássica (aquele com as cinco características que foram reveladas como perdidas nos primeiros cinco capítulos), especialmente sob a liderança de Newton.

            Conclui o físico, com sensibilidade para os mistérios do mundo delineados pela mente humana limitada diante do universo infinito e inabordável em sua plenitude: “Inexoravelmente, o estudo do temo apenas nos remete a nós. Então voltemos enfim a nós mesmos.” (p. 132) E o faz magistralmente nos capítulos 12 e 13 e na conclusão, intitulada “A irmão do sono” (a morte).

            Arrume um tempo, aí, e leia. Você nunca mais será o(a) mesmo(a).

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